os grandes vilões do ferro
Saiba como agem água e oxigênio na corrosão e proteja seus metais

 ano 14  -  n.28  -   jul./dez. 2016 

por Evelyn Rodrigues Gaspareto e Larissa Perdigão

sxc.hu
Ferrugem tomando conta de uma porta de ferro: vilões à solta

Ela tem uma coloração alaranjada ou marrom-avermelhada. Pode estar presente em diversos materiais metálicos. Se não for contida, pode comprometer o portão, o cadeado, a bicicleta, a lataria do carro e até mesmo as colunas dos nossos prédios. É a ferrugem. Você já deve conhecê-la, por tê-la encontrado onde não queria, mas já parou para pensar no porquê de essa estranha camada alaranjada se formar no ferro?

Vamos ver como isso acontece. Primeiro, falemos dos ingredientes. São três as substâncias necessárias para se formar o óxido de ferro, habitualmente chamado de ferrugem: o ferro, a água e o gás oxigênio. E é por isso que a ferrugem acaba por se formar quase que em qualquer peça de ferro: o ar que respiramos já tem oxigênio e água na forma de vapor, ou seja, já tem os ingredientes necessários para que o ferro seja atacado. Assim, vivemos em um ambiente favorável à formação da ferrugem. Observe o quanto é normal encontrarmos na natureza objetos de ferro que já estejam pelo menos um pouco “enferrujados”.

Para entendermos o que ocorre entre essas três substâncias, é importante lembrarmos que os materiais existentes na natureza são formados por átomos. Estes, por sua vez, possuem partículas de carga negativa em suas estruturas: os elétrons. A perda desses elétrons é um processo que chamamos de oxidação. Já o ganho de elétrons é denominado redução. Um átomo que perdeu elétrons é um íon positivo; mais especificamente, é um cátion. Por sua vez, o átomo que ganhou elétrons torna-se um íon negativo e ganha o nome de ânion.

Quando um pedaço de ferro sofre oxidação, costumamos falar que o metal enferrujou. Cientificamente, diz-se que houve uma corrosão eletroquímica. Corroer, aqui, tem sentido similar ao que usamos no cotidiano: carcomer, danificar, destruir pouco a pouco. A questão é que existem vários tipos de corrosão, como a química, a eletroquímica ou a eletrolítica. Para os materiais metálicos, a corrosão é um processo eletroquímico; por isso, vamos fixar nossa atenção sobre esse tipo de corrosão.

Os processos eletroquímicos envolvem uma reação química particular, em que existe a transferência de elétrons de uma espécie química para outra. Nos processos de oxidação, os átomos que compõem materiais como o ferro e outros metais perdem seus elétrons. Os elétrons perdidos pela espécie que se oxida serão os mesmos recebidos por outra espécie química. Portanto, essa outra espécie irá se reduzir. No caso específico de formação da ferrugem, o gás oxigênio é o responsável por retirar elétrons do ferro. Este metal é oxidado e, portanto, corroído. E, ao provocar a oxidação do ferro, o oxigênio se reduz, porque recebe os elétrons perdidos pelo metal.

No entanto, essa transferência de elétrons só ocorre na presença de algum meio que conduza eletricidade. Em geral, é a presença de água que permite o trânsito dos elétrons. É necessário enfatizar que não é a água que oxida o ferro, apesar de ela ter átomos de oxigênio em suas moléculas. Ao contrário: a água é produto da oxidação do gás hidrogênio pelo gás oxigênio. Ou seja, é formada por processo similar ao da ferrugem.

Mas a corrosão pode ser agravada. Em regiões litorâneas, por exemplo, os carros têm vida útil mais curta, se comparado a veículos que circulam em áreas afastadas do mar. Sendo de ferro, claro, todos os veículos estão sujeitos à corrosão. A diferença é a maresia, ou seja, a suspensão, no ar, de partículas de sal marinho. Essas partículas acabam se dissolvendo na água que já fazia a condução dos elétrons na oxidação do ferro. A diferença é que, com sal dissolvido, a água se torna uma condutora de elétrons ainda mais poderosa, acelerando o processo de corrosão.

Descobrimos até aqui os estragos causados pela duplinha da corrosão: oxigênio e água. Poucos são os metais capazes de resistir ao ataque eletroquímico desses dois. O ferro é um dos que mais sentem: exposto à ação da dupla, átomos de ferro se combinam com átomos de oxigênio, gerando substâncias como os óxidos de ferro(III), que compõem a indesejada ferrugem.

Essas substâncias formadas na oxidação do ferro formam uma camada porosa em sua superfície. Excepcionalmente para o ferro, esse material formado não é capaz de proteger as camadas inferiores do metal. Pelo contrário, a cada nova oxidação, desintegra-se o material resultante do ataque ao metal promovido pelo gás oxigênio com auxílio da água, deixando a superfície do ferro exposta a mais ataques corrosivos.

No entanto, há metais cujos óxidos formam uma capa cristalina protetora das camadas metálicas inferiores. É o caso do cobre. A sua oxidação gera a pátina, uma combinação de sais cuja coloração típica, azul-esverdeada, pode ser observada, por exemplo, na Estátua da Liberdade, em Nova York, nos Estados Unidos. Inclusive, é possível provocar a formação dessa capa protetora, em um processo chamado proteção anódica.

Mas, e quanto ao ferro, será que existe a possibilidade de evitarmos a formação da ferrugem? Sim, e, para isso, contamos com os conhecimentos da Química, que, para nossa tranquilidade, mostra diferentes soluções para o problema. Um exemplo é a proteção que se faz em objetos de ferro do nosso cotidiano, como grades e portões. Entre o ferro e a tinta colorida, aplica-se um revestimento protetor, parecido com uma tinta, que tem alta aderência ao ferro e que repele a água. Com isso, evita-se o contato do ferro com o oxigênio e ainda dificulta a chegada da umidade, que conduziria os elétrons para a corrosão ocorrer.

Mas há mais formas de evitar a oxidação do ferro. A corrosão dos navios, por exemplo, é acelerada pelo contínuo contato com a água salgada. Como não dá para trocarmos o casco do navio todas as vezes em que ele enferruja, são ligadas ao ferro pequenas placas de outros metais, chamados metais de sacrifício, que podem ser trocadas de tempos em tempos. O segredo é que esses metais se oxidam mais facilmente do que o ferro. Em outras palavras, os metais de sacrifício cedem elétrons no lugar do ferro, quando ele é atacado. Mas, se o ferro não perde elétrons, continua no seu estado metálico, ou seja, não se forma ferrugem. Zinco, alumínio, magnésio e ligas metálicas produzidas com esses elementos são os principais materiais de que se fazem as placas protetoras. Esse tipo de proteção é chamado de proteção catódica.

Há uma variante da proteção catódica chamada galvanização. Consiste em recobrir o ferro com uma fina película de zinco, que impede o contato do ferro com o ar ou com a água. Mas, e se o revestimento de zinco for ligeiramente danificado ou riscado? O ferro ficará exposto ao oxigênio do ar. Mas não há problemas: o zinco, protetor de outras regiões da peça galvanizada, por estar eletricamente ligado ao ferro e ceder seus elétrons com mais facilidade, será o elemento que se oxidará. Mais uma vez, o ferro será preservado.

Quando esse processo de oxidação, de corrosão, de perda de elétrons pelo ferro não é inibido de alguma forma, ele pode levar a grandes prejuízos: móveis, portões, carros, navios, vigas de construção, entre tantos outros objetos de metal podem ficar irremediavelmente comprometidos, irrecuperáveis. Por isso, é preciso ficar atento. O simples fato de o ferro estar exposto ao meio na presença de oxigênio e água permite a formação da ferrugem. Portanto, da próxima vez que você observar uma camada de ferrugem recobrindo algum metal, recorra à Química. Ela tem receitas certeiras para combater essa vilã.


Cultura Secular

Revista de divulgação científica e cultural do grupo de pesquisa “Investigações Transdisciplinares em Educação para a Ciência, Saúde e Ambiente”.

Comissão editorial
Larissa Perdigão
Michelle Zampieri Ipolito
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Jornalista responsável
Larissa Perdigão (MTb 37654/SP)

Imprenta
Brasília, DF, Brasil

ISSN 2446-4759