entropia: da ordem ao caos
Propriedade física indica o grau de desorganização do universo

 ano 18  -  n.35  -   jan./jun. 2020 

por Natan Andrade da Guia

https://torange.biz/effervescent-tablet-19992 / CC BY 4.0
Dissolução de comprimido efervescente: a entropia aumenta

Você sabe dizer o que um copo de vidro que acaba de quebrar tem em comum com o universo? Ou o que a mistura de dois gases antes separados têm em comum com um comprimido efervescente dissolvido em água? Em todos os casos, verificamos em comum o aumento de uma importante grandeza física, conhecida como entropia. Vejamos agora um pouco de sua história, definição e aplicações.

Em meados do século XVIII, a Europa passou por uma intensa mudança em seu sistema social e econômico. Nessa época, aconteceu o que, hoje, os historiadores chamam de Revolução Industrial, uma expressiva mudança que teve início na Inglaterra e que, posteriormente, se espalhou para outros países a partir do século XIX.

Antes desse período, a maior parte da população vivia nos campos ou em vilarejos. Trabalhavam individualmente ou em pequenos grupos, de modo artesanal, produzindo aquilo que era necessário para sua subsistência. Normalmente, um único artesão possuía todas as ferramentas necessárias para a manufatura e conhecia todas as etapas de produção do objeto.

Entretanto, com a chegada da Revolução Industrial, o trabalho, que antes era feito por uma única pessoa ou grupo, passaria a ser realizado em escala. Ou seja, cada trabalhador seria responsável por uma única etapa dos meios de produção. Mais importante: o trabalho artesanal, feito com ferramentas, seria trocado pelo trabalho realizado por máquinas a vapor.

Uma das primeiras máquinas térmicas de que se tem registro data do primeiro século depois de Cristo, criada pelo inventor grego Heron. Ele usou o vapor produzido em uma caldeira para movimentar uma esfera. Essa é uma clássica conversão de energia térmica, ou seja, energia do calor, em energia mecânica, que é uma energia de movimento. Porém, sua invenção não foi usada com fins práticos. Somente por volta de 1770 foram produzidas as primeiras máquinas térmicas capazes de operar em escala industrial.

Tais máquinas, apesar de úteis, ainda possuíam um problema em sua operação: apresentavam baixo rendimento. O responsável por aperfeiçoar essas máquinas foi o inventor escocês James Watt (1736-1819). Ele apresentou um novo modelo de máquina. Nela, o vapor produzido pelo aquecimento da água era usado para movimentar um pistão que, por sua vez, era capaz de mover certos mecanismos.

Mas o que isso tem a ver com entropia e por que estamos falando sobre máquinas a vapor? A entropia é uma propriedade que surge nesse processo de aprimoramento das máquinas térmicas utilizadas em indústrias.

Em 1824, o engenheiro francês Nicolas Léonard Sadi Carnot (1796-1832) publica seu único trabalho relacionado à termodinâmica. Trata-se de um livro que traz reflexões sobre o calor como causa do movimento. Nesta mesma obra, Carnot apresenta o que viria a ser conhecido mais tarde como ciclo de Carnot: um gás aprisionado em um cilindro de êmbolo móvel sofre expansões e contrações à medida que a temperatura aumenta ou diminui. Nesse processo, pode-se obter energia mecânica pela realização de trabalho.

A obra de Sadi Carnot lançou as bases para a Termodinâmica, dando origem ao desenvolvimento de outros conhecimentos, como, por exemplo, a escala Kelvin de temperatura. Essa escala foi proposta em 1854 pelo físico e engenheiro britânico William Thomson (1824-1907), conhecido como Lorde Kelvin.

Por volta de 1860 e levando em conta o ciclo de Carnot, Rudolf Clausius (1822-1888), um físico alemão, introduz o conceito de entropia. Grosso modo, podemos entendê-lo como o grau de desorganização de um sistema: quanto mais desorganizado um sistema estiver, maior será a sua entropia. Por outro lado, quanto mais organizado um sistema estiver, menor será a sua entropia.

A partir do conceito de entropia foi possível introduzir a chamada Segunda Lei da Termodinâmica. Ela foi enunciada primeiramente por Clausius; posteriormente, pelo Lorde Kelvin. Ambos os enunciados levam para a mesma definição: é impossível que uma máquina térmica transforme completamente sua energia térmica em trabalho.

Voltemos aos problemas das máquinas térmicas do século XIX. Levando em conta a Segunda Lei da Termodinâmica, mostra-se impossível que uma máquina a vapor forneça um rendimento igual a 100%. O caminho possível é o aprimoramento das máquinas térmicas, para que fosse obtido o maior rendimento possível, como Watt fez.

A Segunda Lei também exclui a possibilidade da existência de um moto perpétuo infinito, ou seja, uma máquina capaz de fornecer energia a si própria para seu eterno funcionamento, sem perdas de energia. Isto é impossível porque parte da energia sempre é perdida como calor.

A entropia é uma propriedade física que possui muitas aplicações na Química, na Física e até na Biologia. Uma aplicação clássica da entropia é auxiliar-nos a saber se uma reação química ocorre de modo espontâneo ou não. Se, em uma reação química, houver aumento de entropia, a reação será espontânea. A formação de gases a partir de líquidos ou sólidos, como em um comprimido efervescente lançado na água, é um bom indício de aumento de entropia, pois gases costumam estar mais desorganizados que líquidos ou sólidos.

Outra aplicação da entropia está relacionada com a morte térmica do universo. O universo está se expandindo e se desorganizando. Como consequência, ele chegaria a um ponto onde nenhuma energia estaria disponível para realizar trabalho. Isso aconteceria quando qualquer ponto do universo tivesse o mesmo nível de energia. Nesse ponto, o universo teria alcançado a entropia máxima.

Essa situação pode ser obtida em sistemas isolados: se eles alcançarem a sua entropia máxima, não terão mais qualquer energia disponível para realizar trabalho. Por exemplo, se temos dois recipientes, apenas gás A em um deles e apenas gás B no outro, ao conectarmos esses recipientes, poderemos aproveitar a energia da difusão de cada gás ao outro recipiente. Quando esses gases passarem a estar igualmente distribuídos pelos dois recipientes, já não poderemos aproveitar qualquer energia: é a morte térmica desse sistema.

Uma curiosidade a respeito da entropia é que, diferentemente da energia e da matéria, que não podem ser criadas nem destruídas, mas somente transformadas, a entropia pode ser criada, entretanto, nunca pode ser destruída.

Mas isso vale para o universo. Se olharmos apenas para uma parte do universo, um sistema, a entropia pode diminuir. Uma organização de um sistema gera uma diminuição da entropia desse sistema. Porém, pela Segunda Lei da Termodinâmica, o restante do universo, chamado de vizinhança, tem um aumento de entropia ainda maior, de forma que a soma das mudanças de entropia de sistema e vizinhança, que é a mudança de entropia do universo, nunca é negativa.

A entropia é uma importante propriedade que nos diz quão caótico está um sistema, possuindo inúmeras aplicações nas Ciências. Um copo quebrado está mais desorganizado do que um copo inteiro: sua entropia cresceu. O futuro do universo terá mais entropia do que o seu presente: sua entropia sempre cresce. Mas a entropia de partes do universo pode diminuir. Por isso, a entropia não é justificativa para deixarmos as coisas desorganizadas...


Cultura Secular

Revista de divulgação científica e cultural do grupo de pesquisa “Investigações Transdisciplinares em Educação para a Ciência, Saúde e Ambiente”.

Comissão editorial
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Jornalista responsável
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Brasília, DF, Brasil

ISSN 2446-4759