quando uma conversa deve terminar?
Ninguém sabe, então, apenas relaxe e converse

 ano 19  -  n.37  -   jan./jun. 2021 

por Larissa Perdigão

Pxhere/1553105/CreativeCommons
Conversas podem ocorrer face a face ou a distância, como por telefone

Você já parou para pensar no que faz as conversas terminarem? Pesquisadores das universidades Harvard, da Pensilvânia e da Virgínia fizeram isso. Mais do que isso: eles estudaram quase mil conversas para chegar à decepcionante conclusão de que a maioria das conversas só termina quando seus dois participantes querem que ela termine. Os resultados foram publicados no início de março de 2021 no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

O diálogo é, possivelmente, a mais onipresente de todas as atividades sociais humanas. Mesmo assim, ele ainda é cercado de mistérios. Ele parece a coisa mais simples e banal, mas está muito longe de sê-lo. Tanto é verdade que computadores têm assumido tarefas difíceis, como produções industriais ou cirurgias, mas não são capazes de oferecer mais que um simulacro de conversa.

Uma conversa real exige geração e compreensão imediatas da linguagem, saber quando falar e quando escutar, estar atento aos sinais do interlocutor para saber o que dizer, quando dizer e o que não dizer, entre muitas outras coisas. Geralmente, conversamos muito bem. E parece ser por isso que não nos damos conta de quão complexo é um diálogo. Na verdade, mesmo quando conversamos mal, costumamos ser incapazes de perceber...

Embora algumas conversas sejam encerradas por circunstâncias externas, em muitos casos, as pessoas que decidiram começar a falar também decidem quando parar. Vários profissionais já estudaram sinais verbais que as pessoas usam para encerrar suas conversas, desde o claro “foi ótimo conversar com você”, passando por indiretas como “tenho um compromisso logo mais”, até sinais mais sutis, como “de qualquer forma...”. Mas não havia estudos sobre como e quando as pessoas decidem empregar esses marcadores.

Quando as pessoas conversam por uma razão, poderíamos pensar que as conversas terminam quando seu objetivo é alcançado. Se uma pessoa deseja obter uma fofoca quente de outra, terminaria a conversa logo depois de obter a informação. Se duas pessoas querem marcar um evento, encerrariam o diálogo assim que a data fosse consensual. Dois estranhos que batem papo por prazer em uma festa poderiam encerrar o diálogo assim que o primeiro deles se cansasse e desse qualquer desculpa para ir embora.

Mas as coisas não são tão simples, e não é difícil perceber isso nas nossas próprias conversas. Afinal, um dos principais objetivos das interações verbais é o de estabelecer e manter relacionamentos sociais. Por isso, os participantes costumam observar diversas convenções sociais em busca de proteger os sentimentos do interlocutor. Continuar uma conversa que o parceiro não deseja mais tem um significado social, assim como encerrar uma conversa quando o parceiro deseja continuar falando. Mas os sinais dados pelo interlocutor são suficientemente claros para que a “coisa certa” a se fazer seja feita? Para que terminemos a conversa que nosso parceiro não quer mais, ou para que continuemos porque nosso parceiro assim o deseja?

É aqui que entra o estudo dos pesquisadores das universidades Harvard, da Pensilvânia e da Virgínia. Afinal, problemas de coordenação, no qual as ações de uma pessoa dependem do que ela pensa que outra pessoa fará e deseja fazer, são prontamente resolvidos quando os participantes podem se comunicar expressamente. Porém, comunicar expressamente o desejo de encerrar uma conversa pode ter consequências sociais negativas. Dessa forma, os conversadores podem esconder suas intenções, privando-se mutuamente das informações de que precisam para resolver o problema de coordenação que é o momento de término de uma conversa.

O estudo dos pesquisadores das universidades norte-americanas teve duas partes. Na primeira, foram convidadas 252 pessoas que não se conheciam, as quais foram pareadas para conversar pelo tempo mínimo de um minuto e máximo de 45 minutos. Se terminassem a conversa antes, ainda assim, deveriam fazer outras tarefas com os pesquisadores até completar os 45 minutos, para que não houvesse incentivo externo ao encerramento antecipado da conversa.

Em seguida, os pesquisadores perguntaram aos participantes como avaliavam sua experiência. Quase 70% dos participantes disseram que gostariam que a conversa tivesse terminado antes, o que parece razoável. Outros números, porém, surpreendem: das 126 conversas, apenas 2% terminaram quando ambos os participantes quiseram. Cerca de 10% dos participantes encerraram a conversa mesmo com ambos os interlocutores querendo continuá-la. Em cerca de 30% das interações, pelo menos um dos participantes queria ter continuado. Em média, as pessoas queriam que suas conversas fossem altíssimos 50% mais longas ou mais curtas: sim, metade da duração da conversa.

A suspeita para isso é a de que as pessoas escondem seus verdadeiros desejos, temendo ser rudes ou ofensivos. Tanto que, quando perguntados sobre quanta conversa eles achavam que seus interlocutores queriam, as estimativas ficaram mais de 60% incorretas, para mais ou para menos. Pelo menos, na maioria das conversas, havia acordo entre os desejos, ou seja, apenas em uma minoria de casos um dos parceiros queria continuar tagarelando, enquanto o outro desejava encerrar o papo.

Na segunda parte do estudo, foram entrevistadas mais de 800 pessoas. Os pesquisadores pediram aos entrevistados que descrevessem uma conversa pessoal recente, ou seja, com algum amigo ou familiar, e por quanto tempo desejavam que tivesse durado. Os números foram semelhantes: 67% das pessoas relataram que queriam sair antes que a conversa terminasse, enquanto a maioria desejava que a conversa tivesse sido 50% mais longa ou mais curta do que a duração efetiva. Ou seja, a falha na percepção sobre a duração da conversa ocorreu mesmo quando os interlocutores se conheciam de maneira mais próxima.

A pesquisa dos especialistas de Harvard, Pensilvânia e Virgínia mostrou que ainda há muito a saber sobre os diálogos. Este é um dos primeiros estudos a quantificar as insatisfações e os anseios de duração de uma conversa. E o que se pode concluir, e é algo que já foi verificado em outras pesquisas, é que as pessoas, geralmente, são menos habilidosas do que pensam na difícil tarefa de descobrir o que os outros pensam. Então, já que você dificilmente saberá o que quer o seu interlocutor, na sua próxima conversa, apenas aproveite o prazer de conversar.


Cultura Secular

Revista de divulgação científica e cultural do grupo de pesquisa “Investigações Transdisciplinares em Educação para a Ciência, Saúde e Ambiente”.

Comissão editorial
Michelle Zampieri Ipolito
Larissa Perdigão
Glauco Lini Perpétuo

Jornalista responsável
Michelle Zampieri Ipolito (MTb 12949/DF)

Imprenta
Brasília, DF, Brasil

ISSN 2446-4759