petróleo: sopa química de compostos orgânicos
Mistura de compostos ricos em carbono guarda energia e é matéria-prima de muitos produtos

 ano 19  -  n.38  -   jul./dez. 2021 

por Natan Andrade da Guia e Larissa Perdigão

Petrobras/Agência Brasil/Divulgação
P-51: plataforma que recebe a produção de 10 poços de petróleo do litoral fluminense

Imagine a seguinte cena: você está cavando um belo poço no quintal de sua casa e, de repente, surge um líquido negro e viscoso, jorrando em direção aos céus, impulsionado pelo escape de um gás escondido ali há muito tempo. Sim, você encontrou petróleo!

O petróleo, palavra que tem origem no latim petræ, pedra, e oleum, óleo, é um fluido viscoso com diferentes colorações, que variam de amarelo claro a marrom ou preto. Sua origem remete a muitos milhares de anos e se deve ao soterramento de corpos de algas, vegetais e animais, especialmente no fundo de antigos mares e lagos. A ação do calor intenso e da alta pressão presentes no subsolo por tanto tempo induz à formação de compostos orgânicos ainda mais ricos em carbono do que aqueles presentes na matéria viva.

O petróleo já era conhecido desde a Antiguidade, sendo utilizado para fixar pedras e ladrilhos: o asfalto, afinal, é um derivado do petróleo. Também era usado para fins medicinais e até por povos originários da América do Norte em rituais. A destilação do petróleo para a separação de seus componentes também é antiga, havendo registros na antiga Pérsia e na Europa medieval.

Com a Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra em fins do século XVIII e difundida no século XIX por outros países, a demanda por energia cresceu repentinamente. Máquinas, afinal, demandam energia para funcionar. E o petróleo é uma fonte rica em energia. Porém, inicialmente, a principal fonte dessa energia era o carvão. O petróleo, por ser líquido e apenas coletado dos pontos de onde brotava espontaneamente, não era uma opção.

A história mudou completamente na década de 1850 em função de resultados de intensos trabalhos de desenvolvimento tecnológico. Em 1856, foi aberta a primeira refinaria de petróleo em escala industrial, na Polônia, por Ignacy Łukasiewicz. E, em 1859, Edwin Drake finalmente conseguiu extrair petróleo do subsolo, não precisando mais esperar que o líquido brotasse da terra no seu lento ritmo. Foi a partir daí que o petróleo passou a exercer função estratégica na economia, servindo como fonte primária de combustível tanto em caldeiras e fornos industriais quanto no recém-inventado motor a explosão.

Antes de o petróleo ser extraído, é necessária uma série de estudos para garantir a viabilidade do processo. Isto inclui mapeamento aéreo da região e ultrassonografia do subsolo, ambos feitos por profissionais como geólogos e geofísicos. Uma vez constatada a probabilidade de haver petróleo, inicia-se a perfuração de um poço. Este primeiro poço é conhecido como pioneiro. A escolha de sua localização é crítica, pois, ainda que existam condições que indiquem a presença de petróleo, ele pode estar vazio, gerando prejuízos de milhões de dólares.

A perfuração em terra é feita por meio de uma sonda, constituída de uma torre que possui um tubo por onde passa a broca responsável pela perfuração do poço. No mar, a escavação do poço é essencialmente igual à perfuração em terra, com a diferença de que os equipamentos são instalados sobre plataformas ou navios. A dificuldade maior está na extração de petróleo quando ele está abaixo de uma extensa camada de sal, cuja espessura varia entre 200 e 2000 metros. Neste último caso, diz-se que o petróleo está em uma camada pré-sal.

Após a perfuração, existem três possibilidades: na pior das hipóteses, o poço pode estar vazio. Nas melhores hipóteses, pode haver apenas gás natural, formado principalmente por hidrocarbonetos leves, ou ser encontrado o esperado petróleo, formados pelos demais hidrocarbonetos e, em menor grau, por outros compostos orgânicos, havendo, ainda, gás natural no mesmo poço. O produto extraído é transportado para usinas de processamento, seja por navios, trens ou somente por gasodutos e oleodutos.

O gás natural já é separado do petróleo na extração, seguindo para unidades de processamento de gás natural (UPGNs), onde é separado em três frações. A mais leve, chamada tecnicamente de gás seco, é formada predominantemente por metano e etano, e é vendida, por exemplo, em postos de combustíveis como gás natural, embora seja apenas uma fração dele. Outra é constituída dos gases propano e butano, que são mais pesados e sob pressão, liquefazem, sendo chamados de gás liquefeito de petróleo (GLP) e embalados em botijões para uso, por exemplo, em fogões domésticos. Uma curiosidade é que esses gases não possuem cheiro, sendo necessária a adição de um odorizante, a fim de indicar vazamentos e prevenir acidentes.

Por fim, há uma fração mais volátil de gasolina, chamada gasolina natural, que acaba fluindo com o gás natural, sendo separada nas UPGNs e, muitas vezes, retornando para a cadeia do petróleo. Essa cadeia começa com a chegada do petróleo a refinarias, o que significa que passará por uma série de processos para separação, purificação e modificação de seus componentes. Dois deles merecem destaque: a destilação fracionada e o craqueamento.

Na destilação fracionada, o petróleo é separado em seus componentes com base nas diferenças nas temperaturas de ebulição das substâncias que o compõem. As mais voláteis acumulam-se na parte superior das torres de destilação. À medida que as moléculas são mais pesadas e, consequentemente, menos voláteis, acumulam-se em áreas cada vez mais inferiores da torre. É este o procedimento que separa o petróleo em gás de cozinha, gasolina, nafta, querosene, óleo diesel, parafina, asfalto, entre outras frações. Note que, da mesma forma que o gás natural contém gasolina volatilizada, o petróleo também acumula algum gás. A separação inicial, feita ainda na extração, não é precisa como a realizada nas UPGNs e nas refinarias.

No outro processo mencionado, o craqueamento, hidrocarbonetos maiores e mais pesados são quebrados por aquecimento ou por catálise em moléculas menores, mais leves, com mais aplicações, seja para gerar energia ou como insumos para a indústria petroquímica. O craqueamento da parafina, por exemplo, pode gerar nafta e GLP. Nafta, por sua vez, é uma das principais matérias-primas da indústria petroquímica, sendo o principal componente dos plásticos, mas servindo, também, à fabricação de tintas, medicamentos, tecidos sintéticos, detergentes, borrachas, isolantes elétricos e térmicos, entre muitos outros materiais.

A indústria petroquímica, portanto, faz um uso muito mais nobre do petróleo, não apenas pela vastidão de subprodutos, nem pelo uso construtivo, mas, especialmente, porque o outro uso é a mera destruição do petróleo em sua combustão. Ainda pior é constatar que isso tem gerado grandes quantidades de dióxido de carbono, ou gás carbônico, que é o maior contribuinte para o efeito estufa, o efeito pelo qual parte da energia solar é absorvida pela molécula e deixa de ser liberada de volta ao espaço, sendo retida na Terra e contribuindo para seu aquecimento. Em quantidades moderadas, o efeito estufa é positivo, porque permite que a Terra não fique gelada demais para abrigar vida, tampouco sofra variações extremas de temperatura ao longo do dia e da noite. Porém, intensificado, o efeito estufa passa de mocinho a vilão, deixando a Terra excessivamente quente e podendo implicar, até mesmo, na extinção da vida no planeta.

O petróleo e seus derivados estão no centro da economia mundial e parece impossível abandoná-lo repentinamente. Mas é preciso lembrar que este é um recurso não renovável e que tem impactado o clima negativamente. Alternativas, especialmente a seu uso como combustível, nunca foram tão necessárias. É preciso torcer e trabalhar para chegarmos logo ao dia em que achar petróleo no jardim de casa seja uma maldição, e não mais um benefício.


Cultura Secular

Revista de divulgação científica e cultural do grupo de pesquisa “Investigações Transdisciplinares em Educação para a Ciência, Saúde e Ambiente”.

Comissão editorial
Michelle Zampieri Ipolito
Larissa Perdigão
Glauco Lini Perpétuo

Jornalista responsável
Michelle Zampieri Ipolito (MTb 12949/DF)

Imprenta
Brasília, DF, Brasil

ISSN 2446-4759