usinas nucleares: problema ou solução?
Respostas nacionais contrastam tanto quanto características da fissão nuclear

 ano 20  -  n.40  -   jul./dez. 2022 

por Pedro Marçal

Avda/Wikimedia Commons/CC BY-SA 3.0
Usina de energia nuclear de Grafenrheinfeld, Alemanha, em 2013, mas desativada em 2015

Desde seus primórdios, a humanidade busca formas de dominar a natureza para a produção de energia. O que começou com a manutenção de uma chama obtida em um incêndio natural qualquer tem fontes diversificadas hoje. Entre elas, estão as usinas nucleares. Embora seu funcionamento seja relativamente simples, similar ao de uma usina termoelétrica tradicional, as usinas nucleares buscam calor em uma fonte abundante e perigosa que, até o início do século XX, era desconhecida: a energia nuclear.

Iniciemos a exploração da energia nuclear pela teoria. Em seu clássico artigo sobre a relatividade, o físico Albert Einstein apresentou a famosa equação E=mc², que relaciona a massa (m) e a velocidade da luz (c) com a energia (E). E a energia resultante dessa equação é assustadoramente grande: um grão de areia contém energia suficiente para abastecer de energia elétrica uma cidade inteira por um ano. Portanto, a teoria mostrou uma fonte promissora de energia.

Com isso, diversos outros estudos foram iniciados em busca de obter e controlar tamanha energia. Eles nos levaram à compreensão de dois tipos de reações nucleares: a fissão e a fusão. A reação de fusão acontece ao unirmos dois núcleos atêmicos. Porém, para que isso aconteça, é necessária a aplicação de uma quantidade muito grande de energia, mesmo que, potencialmente, ainda mais energia que a aplicada possa ser liberada. Esse é o principal tipo de reação nuclear a acontecer nas estrelas e é nelas, por essas reações de fusão nuclear, que se forma a maior parte dos elementos químicos que conhecemos.

Em relação à fissão nuclear, ela demanda, de partida, um átomo grande, pesado. Um exemplo pertinente é o átomo de urânio, que tem 92 prótons. A fissão pode ser provocada. Lança-se um nêutron, que é uma partícula sem carga elétrica que compõe a maioria dos núcleos dos átomos, nesse núcleo atêmico pesado, em alta velocidade. Assim, o núcleo se quebra, liberando energia, átomos mais leves e, especialmente, outros nêutrons em velocidade suficiente para atingir outros núcleos pesados. Eis uma das grandes vantagens do processo de fissão: a possibilidade de acontecer uma reação em cadeia, em que um processo de fissão pode gerar outras fissões.

O processo de fissão nuclear é o processo utilizado nas usinas nucleares. É o único que a ciência já consegue dominar. A fusão nuclear, por outro lado, geraria mais energia e de uma forma mais limpa, posto que não geraria o agressivo e perigoso lixo atêmico. Porém, a primeira notícia de que um processo de fusão nuclear tenha sido feito artificialmente resultando em saldo positivo de energia só ocorreu recentemente, neste final de 2022. É uma excelente notícia, mas, mesmo que o experimento se mostre reprodutível, ainda demorará muito, talvez décadas, para resultar em usinas de fusão nuclear comercialmente viáveis.

A fissão, como vimos, demanda como combustível átomos grandes e pesados. Sendo eles instáveis, ou seja, radioativos, o processo de fissão é facilitado. O combustível nuclear mais utilizado é o urânio-235, ou seja, o átomo de urânio que tem, além dos 92 prótons, mais 143 nêutrons no núcleo. Porém, essa forma de urânio, ou, mais precisamente, esse isótopo do urânio, só aparece nas amostras de minério da Terra em proporção inferior a 1%. Mais de 99% dos átomos de urânio no minério de urânio são do isótopo urânio-238, que tem 146 nêutrons no núcleo e não apresenta características físseis, ou seja, não é capaz de sustentar reação nuclear em cadeia.

Isto significa que é necessário “enriquecer” o urânio, aumentando a proporção do isótopo urânio-235 em relação ao urânio-238. Os processos se baseiam na diferença de massa, já que, quimicamente, ambos os isótopos se comportam da mesma forma. A proporção de enriquecimento de urânio necessária a fins pacíficos é mais baixa que aquela necessária para a fabricação de armas nucleares ou combustíveis de navios nucleares. Assim, para saber se determinada porção de urânio objetiva servir de combustível para usinas de fins civis ou de fonte de energia para fins militares, basta observar a proporção de enriquecimento.

A produção da energia elétrica de fonte nuclear, como já dissemos, é similar à produção em usinas termoelétricas: a reação nuclear libera energia para aquecer água ao estado de vapor. Este vapor aciona mecanicamente turbinas que, por movimentarem ímãs e, com isso, alterarem continuamente o campo magnético, geram corrente elétrica. O que muda é a existência de um resfriador para o combustível, o que é dispensável em usinas a carvão ou gás, e um moderador, que é uma substância que controla o ritmo da reação de fissão, para que ela não ocorra de forma descontrolada, costumando ser água ou grafite.

Entre as vantagens desse método de produção de energia elétrica estão a pequena emissão de gases do efeito estufa e o uso de combustíveis que não têm outra função relevante, diferentemente do petróleo, por exemplo, que é insumo da indústria petroquímica. Por outro lado, são desvantagens a geração de rejeito nuclear de alta periculosidade para a vida em caso de vazamento.

Cerca de 10% da energia elétrica mundial é gerada nessas usinas. Enquanto, neste 2022, há países construindo muitas usinas nucleares, como a China, a Índia e a Coreia do Sul, outros vêm desativando as suas, como Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha. Em um mundo que quer diminuir o consumo de combustíveis fósseis e, por isso, vem eletrificando frotas de veículos e fogões de cozinha, apenas o futuro dirá quem acertou.


Cultura Secular

Revista de divulgação científica e cultural do grupo de pesquisa “Investigações Transdisciplinares em Educação para a Ciência, Saúde e Ambiente”.

Comissão editorial
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ISSN 2446-4759