carnaval brasileiro: uma história alegre
O mais conhecido carnaval do mundo foi mais que desfile e trio elétrico
ano 3 - n.6 - jul./dez. 2005
por Larissa Perdigão
Divulgação |
|
Desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro, 2005 |
O que você faz no carnaval? Talvez não goste de brincar o carnaval, e, pode ter certeza, sempre houve uma divisão entre os que gostam de comemorá-lo e os que querem sossego. Mas certamente vai achar bastante interessante conhecer um pouco das origens dessa festa popular que no mundo todo faz lembrar do Brasil.
Durante o período da Quaresma, ou seja, nos 40 dias entre a quarta-feira de Cinzas e o domingo de Páscoa, o fiel da Igreja Católica não deveria comer carne, em respeito à memória da via-sacra percorrida por Jesus Cristo. Daí vem a palavra carnaval, do latim carne levare, que significa "privação de carne". No entanto, popularmente acredita-se que a expressão original era carne vale, ou seja, "adeus, carne!". A interpretação do povo está errada, mas certamente tem mais do espírito carnavalesco.
O carnaval é uma festa popular de características regionais próprias, mas que quase sempre incluem folias, diversões, bailes, fantasias e música. As comemorações acontecem em três dias, do domingo à terça-feira. No Brasil, um país alegre por natureza, o "sábado de carnaval" também é dia de festa, sem falar nas diversas folias pré-carnavalescas e nas micaretas, carnavais fora de época. Em vários outros países, também se festeja o período carnavalesco. Entre eles estão a Itália, a França e a Espanha. Nos Estados Unidos, é tradicional o desfile da cidade de Nova Orleans.
Essa festa popular não tem origens claras, mas acredita-se que, há mais de 2000 anos, comemorava-se na Europa a chegada da primavera, que lá acontece em março. Esse agradecimento aos deuses pela volta do clima agradável e bom para a agricultura pode ter evoluído para o carnaval moderno. Outra origem possível são as celebrações da Roma antiga, como as festas libertinas em homenagem aos deuses Baco e Saturno. No entanto, as festas mudaram muito daquele tempo para cá, principalmente durante o século 20.
A primeira folia de carnaval do Brasil foi o entrudo, que acontecia já no início do período colonial. O entrudo era uma brincadeira violenta, que consistia em atirar baldes d'água, balões cheios de vinagre ou groselha, e pós como cal e farinha, com a intenção de molhar ou sujar as pessoas que passavam pelos foliões. A brincadeira foi proibida inúmeras vezes, mas ela só desapareceu no início do século 20, com a popularização do confete.
O entrudo incentivou a criação de uma festa em local fechado, para um público selecionado, que queria se divertir civilizadamente. Assim, surgiram em 1840 os bailes de carnaval, inspirados nos grandes bailes de máscaras realizados na Europa. O sucesso incentivou outras casas de espetáculos a promover seus próprios bailes. Hoje, essas festas não são tão elitistas, e as máscaras praticamente deixaram de ser usadas, pois os foliões não têm mais medo de ser reconhecidos na festa.
Os tambores apareceram pela primeira vez na metade do século 19, no chamado zé-pereira, uma espécie de passeata de foliões que ocorria nas ruas do Rio de Janeiro. O zé-pereira desapareceu meio século depois, ficando em seu lugar o corso, um passeio de carros e caminhões enfeitados. Os foliões, geralmente famílias em seus veículos, brincavam com as pessoas nas calçadas, cantando músicas de carnaval e jogando confetes uns nos outros. O corso desapareceu na década de 1930, junto com os caros veículos de capota aberta.
A organização da folia surgiu no Rio com as grandes sociedades. Esses clubes de foliões, surgidos na década de 1850, tiveram o seu auge de popularidade no fim daquele século. Ainda hoje desfilam no carnaval carioca, embora atraiam pouquíssimo público. As grandes sociedades, embora tenham origem diferente das escolas de samba, apresentam-se com elementos comuns, como comissão de frente e carros alegóricos, ao som de suas bandas. Elas tinham bastante prestígio porque contavam com intelectuais e políticos importantes. Entre os famosos, Olavo Bilac, Quintino Bocaiúva e José do Patrocínio. Com isso, as críticas sociais e políticas que serviam de tema para seus carros alegóricos eram muito significativas.
Os ranchos ou cordões, outro dos vários tipos de festejo do início do século 20, tiveram sua origem no folclórico Reisado baiano, encenação de uma caminhada de pastores e pastoras até Belém. Durante essa caminhada, os participantes cantavam e batiam de porta em porta pedindo agasalhos. Os Reisados tinham como uma de suas principais qualidades a beleza e o luxo de suas fantasias. Os ranchos cariocas não ficaram atrás, eram muito organizados e evoluídos. As velhas marchinhas de carnaval se popularizavam ao serem cantadas pelos ranchos, numa época em que ainda não havia rádio.
As escolas de samba também têm origem na cidade do Rio de Janeiro. Em boa parte, tinham como origem os ranchos, e deles veio a tradição, por exemplo, do casal de mestre-sala e porta-bandeira. O primeiro grupo a ser criado com o título de "escola de samba" foi o Deixa Falar, em 1928, no bairro do Estácio. Seguiu-se a ele muitos outros grupos, em diversos bairros da cidade. Entre as escolas da época ainda em atividade estão a Estação Primeira de Mangueira e a Portela, que se chamava Vai Como Pode, mas teve de mudar de nome anos depois por exigência da polícia.
Os desfiles das escolas caíram logo no gosto popular. A praça Onze se tornou pequena para abrigar a quantidade cada vez maior de foliões e de público, e as escolas passaram a desfilar nas avenidas do centro do Rio nos anos 70. Na mesma época, com a mudança na estética das fantasias, o carnaval se tornou muito caro, e os bicheiros passaram a financiar as escolas. A modernização da administração das escolas nos anos 80 permitiu que os desfiles continuassem acontecendo com o mesmo brilho, apesar da prisão dos grandes bicheiros.
Os desfiles tornaram-se praticamente sinônimo de carnaval no centro-sul do Brasil. No Nordeste, as festas mais populares do carnaval são as de rua. Na Bahia, o trio elétrico, criado em 1950 pelo lendário Dodô e agora espalhado por todo o país, e em Pernambuco, a dança dos blocos de frevo. Foi assim, com tanta gente participando das folias, que o carnaval brasileiro se tornou o maior e mais conhecido do mundo.
Cultura Secular
Revista de divulgação científica e cultural do Secular Educacional.
Comissão editorial
Larissa Perdigão
Rodolfo Augusto Vieira
Jornalista responsável
Larissa Perdigão (MTb/SP 37654)
Imprenta
São Carlos, SP, Brasil
ISSN 2446-4759
|
|